Nem sempre temos o que queremos

Não. Nem sempre teremos o que queremos na vida. E ainda bem!

Quando a nossa acção exterioriza necessidades superficiais, a vida apresentará mais cedo ou mais tarde marcos e indicadores daquilo que precisa de ser examinado, avaliado e redefinido. Somos assim convidados a irmos reconhecendo, integrando e honrando as raízes profundas dos nossos valores, da nossa essência.

Tudo isso porque a vida pede que sejamos capazes de caminhar em autenticidade, de seguir em frente com resiliência, apesar e para além de tudo. E, no processo, irmo-nos lapidando, resgatando e integrando habilidades e faculdades profundas, latentes por detrás das camadas superficiais da persona, que tende a viver voltada exclusivamente para fora. É preciso cultivar a capacidade de olhar para dentro, trabalhar na flexibilidade e abertura, de forma a sermos capazes de fazermos ajustes na forma de caminhar e de percepcionar o caminho.

Porque há caminhos que nos somam, outros que nos distraem.

É importante desenvolver uma atitude de desapego saudável perante os factos externos, bem como para com o significado que lhes atribuímos. Se estivermos instalados desde o nosso centro, o olho da tempestade, o fio conductor da direção e atitude a tomar será cada vez mais presente. Pois só assim saberemos de onde vimos e em que direcção nos propomos caminhar.

Porque por vezes não temos o que queremos, mas o que precisamos. Não termos o que queremos, pode revelar-se uma bênção para que assim possamos retomar ao nosso próprio caminho individual…. E isso, por si só, é uma bênção.

Ser Grato, é dar espaço para um Novo Olhar poder emergir desde dentro.

Não existem condições ideais – existe a atitude ideal

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Chega uma altura em que temos de arriscar. De assumir o que somos, quem somos, e avançar, cumprir os planos a que nos propomos, sejam eles profissionais, sociais, afectivos, pessoais.

De pouco adianta estarmos constantemente à procura da melhor informação, o próximo workshop de desenvolvimento, o próximo retiro, a próxima terapia, o próximo livro de autoajuda… Pouco adianta estarmos à espera que surjam as condições externas ideais para fazermos acontecer. Até porque as condições ideais não existem. Existe sim a atitude ideal, independentemente do exterior. De pouco adianta estarmos constantemente a adiar para depois aquilo que almejamos viver e fazer acontecer.

Os recursos aparecem ao longo do caminho e, de acordo com o momento, veremos e saberemos onde procurar ajuda para assim a implementarmos na prática. Tudo e todos os recursos que necessitamos já estão dentro de nós mesmos, e se desbloquearão e surgirão no momento certo, à medida que se caminha. Seja através de insights ou tomadas de consciência, ou através de algo ou alguém que surge e sentimos que nos possa assistir e ajudar.

Sim, há coisas que não estão nas nossas mãos fazer acontecer ou controlar, e aí há que usar paciência, resiliência e aceitação. Tudo pode ser aprendizagem para crescimento e evolução. Mas há momentos nas nossas vidas onde é o conformismo e a procrastinação interior fruto de crenças antigas que sabotam o nosso bem-estar e realização.

Quando atravessamos o medo de “falhar”, damo-nos conta que o maior falhanço que pode haver é escutarmos a voz interna do medo, em vez daquela vozinha que, abafada, sussurra no nosso peito.

Por vezes demasiada informação gera dispersão, gera ruído, gera hipnose e letargia. Gera obstipação mental, por não haver motivação e predisposição genuína e real para a implementação e digestão de tanta teoria na prática no terreno.Há que agir, passar à ação, e isso muitas vezes significa estarmos dispostos a abrir mão da ideia do que somos para o que nos podemos tornar. Abrir mão do nosso eu antigo que nos mantém congelados e presos, no registo de vítimas do destino.

Porque a vida, é agora. E espera pela tua atitude alinhada com o profundo em ti.

Não vivas à espera que aconteça – vive fazendo acontecer!

E lembra-te…”A quem muda, Deus ajuda”

Jorge Miguel Porfírio

EGO – Relação ou Ralação?

E pronto… mais uma semana a terminar, e com ela mais uma semana de sessões de Yoga a chegar ao fim… Todos levamos para a sessão de Yoga não só a roupa e objectos pessoais, mas também toda a carga psicoemocional das vivências das experiências mais marcantes vividas recentemente. E isso é válido para todos nós, onde quer que possamos ir ou estar a cada momento.

O meu ego esta semana tem sido fortemente sacudido e a minha atenção/presença colocada à prova. Como tal, senti ser apropriado (e como muitas vezes o momento do grupo me impele a fazer), transformar o conteúdo normal da sessão de Yoga (posturas, exercícios respiratórios, meditação e relaxamento) em mais uma oportunidade de discussão e exposição de um tema. O tema desta semana, e face ao momento actual, foi EGO.

Num contexto de Yoga, considero também salutar abordarmos os dilemas “pessoais” de uma forma possibilitadora, aberta, inclusiva, impessoal, ou transpessoal. Ou seja, abordar um tema que à partida tenderia a ser abordado de uma forma pessoal, exclusiva a uma pessoa, e “abrir” o tema para o grupo. Porque no fundo, o desafio primordial em todos os percalços e desafios que vivemos nas nossas vidas, é o mesmo para todos nós. Podem mudar as personagens, as situações, os cenários, os contextos…. porém, o “sumo” a retirar de cada experiência, ou o mecanismo psicoemocional envolvido, é o mesmo para todos e cada um de nós. Também a aprendizagem!

Assim, decidi abordar a necessidade de reconhecermos a nossa “sombra” ou ego. As características relativas a aspectos de nós mesmos que tendemos a negligenciar, e até a esquivar-nos da aceitação que fazem parte de nós. O que temos “debaixo do tapete”… A nossa “sombra” ou ego, é uma dimensão do ser humano que tende a ser muitas vezes observada de lado no meio espiritual, chegando até ao ponto de o abominar, e de o rotular como algo necessariamente “mau”. Cria-se e alimenta-se muitas vezes a ideia que o objectivo primordial é “derrotar” o ego, não lhe dar importância, excluí-lo de nós mesmos. Sem nos darmos conta que, aquilo que excluímos da nossa vida acaba por comandar o nosso destino, aquilo contra o qual lutamos, sai fortalecido… mas aquilo que aceitamos, tende a dissolver-se.

Ora, da minha percepção, o ego é algo fundamental em todos nós. É através do ego que temos uma identidade, que temos um conjunto de valores, de crenças, de convicções. É através do ego que construímos as nossas redes de relacionamentos, que elaboramos planos na e para a vida tomando decisões – desde as mais básicas e triviais às mais determinantes. E assim moldamos o nosso destino. Querer ou ambicionar descartar o ego, é o mesmo que querer evitar a nossa própria sombra. Por muito que queiramos fugir dela e correr a sete pés, ela vai atrás. Tudo aquilo que não temos tornado consciente em nós mesmos, a vida mais cedo ou mais tarde vai trazer algo ou alguém que vai ter a função de ser um “gatilho”… o “gatilho” de algo latente que, no inconsciente, na sombra, o ego tende a não querer encarar. E acciona-se o mecanismo de defesa/ataque, ao nos sentirmos “ameaçados” na “nossa verdade”, quando no fundo é o ego que, em algum ponto, se experiencia “tocado”.

Quanto mais espaço interno estiver tornado claro, mais facilidade, fluidez, clareza e naturalidade cada um de nós terá para fazer escolhas diferentes no dia a dia. O objectivo de uma prática de desenvolvimento pessoal e/ou “espiritual” (e coloco espiritual entre aspas pois, como tantos outros termos, hoje em dia é um dos que tem o seu real significado imensamente deturpado), é apoiar o indivíduo a ver-se desde uma outra perspectiva, e consequentemente o mundo ao seu redor. No processo, ocorre uma educação do ego. Descobre-se a possibilidade de nos tornarmos responsáveis por redesenhar a nossa forma de perceber o processo da vida, em nós mesmos. Aceitar o ego, não no sentido de nos conformarmos a ele e de a ele sermos submissos, mas aceitar no sentido de que apenas assim teremos espaço para trabalhar nele e com ele. De o reeducar. Torná-lo mais saudável, no sentido de estar aberto e receptivo à aprendizagem que a própria vida se encarrega de lhe fazer chegar, momento a momento.

Tal como disse anteriormente, observei que ao longo da semana o meu ego, tal como o de muitos de nós, tem sido fortemente sacudido face a imprevistos, mudanças e reviravoltas que, do “nada”, surgiram no caminho. E com elas, tive oportunidade de perceber de uma forma clara a importância, não só de fazer escolhas, mas do espaço em mim desde onde elas estavam a aflorar. E dei-me conta da necessidade de honrar e preservar esse espaço profundo, e desde aí, respirar à superfície.

Na última sessão de Yoga da semana, mais um imprevisto bateu à porta – literalmente. Estávamos precisamente a falar dos imprevistos e desafios que cada um tem estado a sentir na pele, e desde que parte de nós estávamos a lidar com eles. No outro lado da porta, alguém necessitava de colocar um veículo dentro de uma garagem, e havia um carro a bloquear a entrada. Era o meu carro!

Fui convidado a afastar o carro da frente de um porta de garagem que pertence ao mesmo edifício onde estava a decorrer a sessão. Tinha-me sido indicado logo pela manhã por uma representante do espaço, que poderia deixar ali o carro sem problema. Fui, interrompendo a sessão, com plena consciência do alinhamento do acontecimento com o tema debatido. Mas não pude deixar de mostrar alguma indignação perante o facto de me ver forçado a interromper uma actividade, pelo que expressei isso mesmo aos intervenientes, do incómodo da situação. Uma das pessoas, levou a mal o facto de eu ter dito o que disse, na forma COMO eu disse. Reconheci que o meu ego se sentiu incomodado, e uma energia emocional oriunda dessa marca deu força às palavras que expressei. Porque por vezes o que marca não são propriamente as palavras, mas a carga emocional que as anima por detrás delas. O ser humano responde ao SENTIR. Em resposta, ele afirmou num tom de voz algo agressivo que, se eu não quisesse ser interrompido na minha actividade, para a próxima para deixar o carro “bem estacionado” e não à frente de uma garagem.

Percebendo a energia emocional que estava a actuar por detrás da sua atitude verbal, dirigi-me a ele e pedi-lhe desculpas por eu ter colocado uma energia emocional mais agressiva na forma como me expressei verbalmente. A dinâmica da energia de ambos mudou nesse momento. Do outro lado, veio um pedido de desculpa também, seguido de “… sabe como é, o lado animal vem ao de cima. Sentimo-nos ameaçados, temos que nos defender….” Despedimo-nos com um “Saúde”, e ambos com as mãos no coração. E regressei para a sessão de Yoga.

Já dentro da sala, foi-me dito que essa pessoa é polícia. Podia ter sido um pedreiro, um médico, um sapateiro, um cirurgião, um mendigo, um advogado, um professor, um psicólogo… Podia ser eu ou tu. Ou então um pai, ou uma mãe, um companheiro ou companheira, um amigo, um colega…

A situação que partilhei podia muito facilmente ter escalado para outros níveis de conflito defesa/ataque (e quiçá outros graus de gravidade) se o desenrolar continuasse a ser dominado pela impetuosidade emocional. Acabou por se dissolver com ambas as partes a reconhecerem um lado mais profundo de si mesmas, relacionando-se com o outro lado.

Todos temos o nosso ego. Sem excepção. Todos temos a nossa bagagem, consciente e/ou inconsciente. Até que a pessoa certa, no contexto certo, nos toca nesse ponto e é accionado um alarme…

Quem afirma que se “livrou” do ego, a minha sugestão é estar-se bem atento ao comportamento da mesma pessoa, não se esteja a enredar numa rede que nem sequer é nossa devido a carências, sejam elas de que ordem for.

Todos temos a capacidade de, havendo sinceridade, abertura e receptividade, de construir um mundo melhor com o próximo. Assim em cada um haja a humildade suficiente para reconhecer o quão pode trabalhar em si mesmo e tornar-se uma versão cada vez melhor de si mesmo, dia a dia. E assim, o presente parece desdobrar-se. Como se o caminho único de repente se bifurcasse em duas possibilidades. E, de repente, temos uma oportunidade de escolha… Escolher fazer diferente. De SER diferente! E irmos em direção a um futuro colectivo diferente.

Há uma escolha a ser feita. E ela está dentro de cada um de nós.

Porque por vezes, não são os outros ou as situações que têm que mudar para ir ao encontro do nosso gosto, das nossas carências, das nossas necessidades e expectativas… Do nosso ego.

O que há mudar é a forma de vermos os outros e às situações. Mas para isso, há trabalho a ser feito. Temos de olhar para dentro primeiro.

Caminhamos.

M.